Fonte:www.gazetadopovo.com.br
Opinião
O cenário é bastante complexo. A política de reajustes quase diários da Petrobras, seguindo o mercado internacional, foi uma escolha que se revelou acertada para recuperar o caixa e a credibilidade da empresa, destruídos pela irresponsabilidade da herança lulopetista. O presidente da empresa, Pedro Parente, primeiro defendeu a política com unhas e dentes, mas ontem anunciou que reajustaria o preço na refinaria por 15 dias. Pode ter sido uma escolha estratégica diante de uma crise que escalou rapidamente, mas há custos para a credibilidade da empresa que já se sentem nas ações da companhia. O fantasma do controle de preços é preocupante também porque está na raiz de muitas das distorções do mercado de refino no Brasil: apesar de a Petrobras não ter mais esse monopólio desde 1997, os altos custos e a concorrência desleal do governo criam entraves à expansão de refinarias privadas. No limite, as contradições de uma empresa que não se decide entre proteger o consumidor brasileiro de choques na cotação internacional ou remunerar seus acionistas e investir em modernização deveriam trazer de volta a discussão sobre a necessidade de uma estatal do petróleo.
As reações da classe política também surpreendem. O movimento dos caminhoneiros é forte, parece contar com a simpatia da população, o governo federal está enfraquecido, sem nenhum capital político e cercado pelo clima de fim de feira. Em ano eleitoral, isso convidou o Legislativo às velhas soluções populistas, fiscalmente irresponsáveis e focadas no curto prazo. Se a proposta de zerar a Contribuição da Intervenção no Domínio Econômico (Cide) em meio à crise fiscal já era preocupante, a solução do Congresso Nacional de zerar o Pis/Cofins é ainda mais alarmante. Por mais que a Câmara tenha aprovado ontem o projeto de reoneração da folha de pagamento de 28 setores – que ainda depende de uma aprovação incerta pelo Senado –, Executivo e Legislativo se contradizem sobre o impacto da medida nas contas públicas, aumentando a pressão sobre uma perspectiva já assustadora de déficit público de R$ 159 bilhões para este ano. É surpreendente, ainda, lembrar que a falta de disposição do Congresso em aprovar medidas impopulares esteve na origem da decisão do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles de aumentar o Pis/Cofins.
Opinião da Gazeta: Resistir às tentações (editorial de 23 de maio de 2018)
Qualquer que seja a solução encontrada, o país já terá perdido, pelos maus exemplos a que assistimos nesses dias: a tentação da irresponsabilidade fiscal, a impressão de que quem grita mais alto obtém benefícios às custas do restante da população – no longo prazo, as distorções do mercado aumentam o preço para todo mundo –, e o afastamento de uma opção de desenvolvimento para o país com mais liberdade econômica. Também sai perdendo nossa capacidade de planejamento: afinal, ninguém explica como as decisões aventadas agora lidam com os problemas que subjazem a toda a confusão.
Os impostos federais têm impacto no preço do combustível, mas é o ICMS estadual que tem mais peso. Seja como for, não será possível reduzir impostos se não enxugarmos o Estado como um todo, revendo os gastos públicos. Além disso, as condições do mercado internacional, que já analisamos neste espaço, apontam para a manutenção da tendência de alta nos preços, o que pode recolocar o mesmo problema que estamos enfrentando daqui algumas semanas ou meses. O mais razoável seria esperar pelo novo equilíbrio – basta pensar que a alta dos preços permite que os Estados Unidos voltem a se inserir no mercado como produtores. Tampouco se pode esquecer a política de subsídios à compra de caminhões no governo Dilma Rousseff (PT), que tem responsabilidade na queda do preço do frete. Por fim, é preciso lembrar que essa crise seria bem menor se o Brasil não fosse tão dependente do modal rodoviário, o que nos convida a planejar melhor o desenvolvimento do país.
Nada disso é solucionável com um passe de mágica, muito disso é consequência de decisões equivocadas do passado, mas uma classe política com visão de longo prazo aproveitaria o momento que estamos vivendo para destravar os gargalos estruturais do setor – infelizmente, não é isso que está ocorrendo. Também não há dúvidas de que cada crise é uma oportunidade para exercitarmos o protagonismo da sociedade civil e buscarmos soluções dialogadas. Se isso for feito dentro da lei e da convivência democrática, será positivo por si só. No entanto, da maneira como a solução parece estar se encaminhando, estamos mais uma vez reforçando a tendência de sacrificar o futuro para garantir as gambiarras do presente e de apelar para a força antes do convencimento. Que ao menos não nos esqueçamos disso no debate eleitoral deste ano.
25 de maio
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